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Bridgerton: Shonda Rhimes estreia-se com nota positiva

Tive acesso antecipado à primeira produção de Shonda Rhimes para a Netflix, que chega, qual presente no sapatinho, no dia de Natal. «Bridgerton» é um romance de época moderno, um pouco diferente daquilo a que a super-produtora nos habituou, mas igualmente irreverente.

Bridgerton
LIAM DANIEL/NETFLIX © 2020

«Downton Abbey» meets «Pretty Little Liars» e o resultado é «Bridgerton», a primeira série com produção executiva de Shonda Rhimes após o contrato milionário com a Netflix. Embora não esteja propriamente dentro do estilo a que a autora habituou a audiência na última década, «Bridgerton» mantém a irreverência e o lado sexy, na abordagem moderna de uma história datada no século XIX. No centro da ação estão Regé-Jean Page, que Shonda resgata de «For The People», e Phoebe Dynevor, que tem marcado presença em produções britânicas como «The Village» ou «Dickensian».

Daphne Bridgerton (Phoebe Dynevor) é considerada, pela própria rainha (Golda Rosheuvel), o “diamante” da mais recente maratona de “candidatas” a noivas em Londres. As jovens são exibidas pelas mães primeiro à rainha, e depois por todos os bailes organizados nas redondezas. O objetivo? Conseguirem o melhor match possível entre os solteiros elegíveis da comunidade. No entanto, e para apimentar as coisas, há um novo elemento pronto a desconstruir os hábitos tradicionais da época: a misteriosa Lady Whistledown (voz de Julie Andrews). No anonimato, a mulher publica no seu folhetim todos os rumores e escândalos londrinos, criando e destruindo reputações através das suas palavras.

Bridgerton
LIAM DANIEL/NETFLIX © 2020

Além de Daphne, outro dos seus alvos prediletos é o duque Simon Basset (Regé-Jean Page), recém-chegado. O jovem não ambiciona casar, mas nem por isso deixa de ser abordado em massa pelas mães e filhas da cidade, que veem nele um bom partido/marido.

Ironicamente, Lady Whistledown alcança, à boleia da mesma sociedade que a reprime, a voz e o espaço que nunca é concedido às mulheres. O sexo feminino é reduzido à insignificância, totalmente abafado pela vontade dos homens, a quem tudo é permitido e cuja “verdade” é a única aceitável. Com humor, irreverência e muito romance, «Bridgerton» critica a própria sociedade que ilustra, reivindicando às mulheres, inclusivamente não caucasianas, o lugar que não tiveram na época. A espaços, as personagens masculinas chegam mesmo a ser caricaturas, ridicularizadas, e destituídas do poder que usaram (e do qual abusaram) durante séculos.

Enquanto Daphne e as restantes raparigas se movem, sem margem para imperfeições, entre bailes e festas exuberantes, as suas fraquezas vão sendo relevadas. Assim como as da sociedade, hipócrita e desigual. O universo de glamour vai sendo desmascarado progressivamente, e não há intocáveis nas famílias mais notáveis de Londres. Nem mesmo entre homens habituados a vingar a qualquer custo e sem consequências. Uma análise interessante de outros tempos, protagonista frequente na ficção, feita com muito drama, entretenimento e de forma despretensiosa. Uma das personagens que mais contribui para uma leitura mais criteriosa da ação é Eloise Bridgerton (Claudia Jessie), uma adolescente sedenta de conhecimento.

Bridgerton
LIAM DANIEL/NETFLIX © 2020

À crítica da narrativa também não escapam as mamãs de Londres, nomeadamente Portia Featherington (Polly Walker), que corporiza os principais vícios da época. E nem mesmo a mais ponderada Violet Bridgerton (Ruth Gemmell) descura a relevância de um bom casamento e dos deveres dos seus filhos e filhas, sobretudo o mais velho, Anthony (Jonathan Bailey).

«Bridgerton» é baseada na saga literária da autora Julia Quinn, sendo que a primeira temporada tem como inspiração o livro The Duke and I, publicado em 2000. Trata-se de uma trama capaz de revisitar a história de forma menos séria, mais divertida e, como já mencionado, com muito romance. Uma maratona (estratégica) de Natal que, não sendo de uma qualidade acima da média, proporciona sem dúvida um bom entretenimento. Para já, Shonda Rhimes começa com nota positiva na Netflix.

Bridgerton
LIAM DANIEL/NETFLIX © 2020

A sua primeira produção é da autoria de Chris Van Dusen, que já colaborou com ela em «Anatomia de Grey», «Scandal» e «The Catch», entre outras apostas da super-produtora. No elenco destacam-se ainda Adjoa Andoh, Ruby Barker, Sabrina Bartlett, Harriet Cains, Nicola Coughlan, Ben Miller, Luke Newton e Freddie Stroma, entre muitos outros. A série conta ainda com a participação do português Alfredo Tavares.

 

Texto originalmente publicado aqui

 

 

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