Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes

Do erro e das suas consequências. Disponível no Disney+, «Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes» acompanha um episódio marcante e perturbador da história britânica: a morte de um jovem brasileiro baleado pelas autoridades, após ter sido identificado, erradamente, como um bombista suicida.

A aposta «Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes» recria o clima de medo e incerteza que se instalou em Londres após os atentados terroristas de 7 de julho de 2005, quando um conjunto de explosões coordenadas no sistema de transportes provocou dezenas de mortos e feridos. Nos dias seguintes, a capital britânica viveu um estado de alerta permanente, agravado por uma nova tentativa de ataque, desta vez falhada, a 21 de julho.

Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes

Este clima de tensão não era exclusivo do Reino Unido. Desde os atentados de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, várias capitais ocidentais viviam sob o espectro constante do terrorismo. Isto deu origem a políticas de segurança mais agressivas, maior vigilância sobre as comunidades migrantes e uma crescente normalização da suspeita como forma de prevenção. A luta contra o terror tornou-se uma prioridade internacional, mas também um terreno fértil para abusos, decisões precipitadas e erros irreversíveis.

Foi nesse contexto de medo globalizado, em que o risco de agir tarde parecia mais gravoso do que o risco de agir mal, que Jean Charles de Menezes (Edison Alcaide) foi confundido com um dos alegados bombistas e morto por agentes em plena luz do dia. Um erro fatal que expôs as falhas de um sistema que, sob pressão para proteger, perdeu a capacidade de distinguir com clareza quem representa, de facto, uma ameaça. Uma falha que, tal como a série o demonstra, parecia impossível de acontecer, já que as semelhanças de Jean com o verdadeiro suspeito são praticamente inexistentes.

Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes

Em vez de se limitar a reconstituir os factos, a série opta por explorar os bastidores da tragédia: os momentos de indecisão, os silêncios incómodos e as ordens contraditórias que acabaram por resultar numa morte absurda. O público acompanha o desenrolar dos acontecimentos, onde a pressão e a falta de certezas moldaram cada passo. Paralelamente, conhece a vida de Jean Charles, retratado não como uma vítima passiva, mas como um jovem imigrante cheio de planos e rotinas interrompidas brutalmente por um erro sistémico… e evitável.

«Suspeito: O Assassinato de Jean Charles de Menezes» não é apenas a história de um falhanço policial. É um ensaio ficcional sobre o preço da segurança num mundo dominado pelo medo. Até que ponto o Estado pode falhar na sua missão de proteger sem pôr em causa os próprios valores democráticos? Como se distribui a culpa quando todos agem sob ordens, mas ninguém assume as consequências? A série levanta questões incómodas, muitas delas ainda por responder quase duas décadas depois.

O elenco inclui nomes como Conleth Hill, Russell Tovey, Emily Mortimer, Daniel Mays, Max Beesley e Anna Moreno.

 

Texto originalmente publicado na Metropolis

 

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