Quando a carreira de Andrew Cooper desmorona, ele faz o que qualquer ex-magnata sensato faria: começa a roubar as casas dos vizinhos ricos. Afinal, quem é que vai dar pela falta de mais um Rolex? «Your Friends & Neighbors» é a nova série da Apple TV+.
Mesmo depois do divórcio, Andrew Cooper (Jon Hamm) tinha tudo: uma carreira de sucesso, uma casa de sonho, vizinhos milionários e uma vida despreocupada. Até que perde o emprego… e descobre que furtar luxos alheios é mais fácil do que pedir um empréstimo. Afinal, em Westmont Village, os segredos escondem-se melhor atrás de portas trancadas do que em cofres. O que começa como um impulso desesperado transforma-se rapidamente numa rotina arriscada; e, para Cooper, perigosamente viciante.
Entre jantares fastiosos, sorrisos plastificados e casas mais cheias de egos do que de pessoas, «Your Friends & Neighbors» mergulha no submundo da alta-sociedade suburbana, onde todos fingem ter tudo… e ninguém parece notar quando algo (ou alguém) começa a faltar. Com um humor negro afiado e diálogos carregados de tensão passivo-agressiva, a série desmonta a ilusão de perfeição com estilo. É que, no fundo, «Your Friends & Neighbors» é menos sobre o que se rouba… e mais sobre o que as pessoas escondem.
O subúrbio aqui não é um símbolo de segurança ou sucesso, mas uma montra cuidadosamente construída onde a aparência é a única moeda com valor. As personagens vestem a moralidade como quem usa um bom casaco: por conveniência, não por convicção. Traem-se, enganam-se e castigam-se mutuamente, mas continuam a brindar com vinho caro como se nada tivesse acontecido. O principal crime, afinal, pode não ser o roubo, mas a fachada que todos aceitam manter. E é aí que «Your Friends & Neighbors» acerta em cheio: ao mostrar que, por vezes, o que está mais podre não é o que desaparece… mas o que sobra.
É fácil ver Coop como um herói trágico, esmagado pelas pressões de um sistema que valoriza mais a imagem do que a humanidade. Afinal, é vítima de um mundo que o descartou assim que perdeu utilidade. Mas essa leitura esbarra em pequenos detalhes, pelo que o ciclo de empatia não é completo: há olhares de autocomplacência, a racionalização constante das suas ações, e o prazer mal disfarçado que encontra ao invadir a intimidade dos outros.
Se Andrew Cooper é o centro da narrativa, Sam (Olivia Munn) e Mel (Amanda Peet) são o espelho que ele recusa encarar, cada uma à sua maneira. Ambas as personagens são muito mais do que satélites na órbita do protagonista: vivem as suas próprias batalhas, e destacam-se no equilíbrio entre força e vulnerabilidade. As atrizes entregam interpretações que se aproximam e, simultaneamente, fogem à caricatura. Não são vítimas passivas nem figuras redentoras. São mulheres que carregam os seus próprios dilemas, erram, cedem, enfrentam.
No final, «Your Friends & Neighbors» deixa claro que, se há algo realmente valioso nos subúrbios de Westmont Village, não são as mansões ou os carros de luxo, mas sim a habilidade de manter a máscara perfeita. Cooper até pode ser o ladrão da história, mas, no fundo, todos estão a roubar ou manipular alguma coisa: umas vidas vazias disfarçadas de perfeitas, outras relações moldadas para parecerem mais felizes do que realmente são. E a lição? O crime perfeito não é roubar uma joia, é roubar a autenticidade, e ninguém parece importar-se com isso. Afinal, quem quer ser genuíno quando se pode ser fabuloso?
A série é uma criação de Jonathan Tropper (Banshee), e conta ainda no elenco com Mark Tallman, Lena Hall, Aimee Carrero, Hoon Lee, Dave Quay e Corbin Bernsen, entre outros.
Texto originalmente publicado na Metropolis
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