REVIEWS

Uma Pequena Luz: ser chama na escuridão

O streaming Disney+ estreia amanhã a série «Uma Pequena Luz», cuja narrativa incide sobretudo nos civis que ajudaram a família de Anne Frank em Amesterdão. Um murro no estômago.

Miep Gies (Bel Powley) é a figura central da nova produção do National Geographic, «Uma Pequena Luz», uma série que retrata o exigente desafio que Miep, o marido e outros civis enfrentaram para proteger a família Frank. A mulher é um nome conhecido na história trágica de Anne Frank (na série interpretada por Billie Boullet), desde logo porque guardou o diário da jovem e o entregou depois ao pai, o seu ex-chefe, Otto Frank (Liev Schreiber). Uma série pesada, como não poderia deixar de ser, que se alimenta da tensão e escuridão do argumento, levando a audiência a conhecer uma cidade de Amesterdão mais sombria do que o habitual.

«Uma Pequena Luz» começa com uma carga intensa, pautando logo ao que vem. Miep deve passar um controlo Nazi com Margot Frank (Ashley Brooke), que está aterrorizada; e disso depende a sobrevivência de ambas. Ver duas pessoas, que nada fizeram, a temer pela vida só pela sua natureza, é algo verdadeiramente impactante. E quando a série viaja ao passado para apresentar a “vida normal” dos envolvidos, a situação tem ainda uma brutalidade maior. Assistir a Miep e a Amesterdão em festa, quando todos sabemos o que aí vem, é uma situação que afeta o espectador a um nível muito profundo. Não vem aí nenhum twist, nenhum golpe narrativo genial, mas é na sensação de não escapatória que reside a maior violência de toda a série.

A série constrói bem o ambiente que se dispõe a retratar, pelo que a emoção surge com naturalidade quando vemos a série. Com interpretações competentes e situações credíveis, perante o que conhecemos da época e dos envolvidos, tudo se aproxima do real e desperta uma sensação de sufoco. A própria ficção, quando imita a realidade tão de perto, e ainda por cima esta realidade, supera a sua mera existência no pequeno ecrã; vai mais longe.

Haverá pouco que não se sabia sobre a história de Anne Frank e da sua família, pelo menos no que diz respeito aos seus contornos mais gerais. Fechados durante vários meses num espaço claustrofóbico, não podiam fazer qualquer som, pois isso implicaria muito provavelmente serem apanhados. Quando, no episódio piloto, Miep diz a Margot que aquela é a melhor altura para chorar, se o quiser fazer, percebemos como até a dor monstruosa que todos sentem tem de ser vivida em silêncio.

«Uma Pequena Luz» conta no elenco com Andy Nyman, Noah Taylor, Laurie Kynaston, Hanna van Vliet, Joe Cole, Amira Casar, Ian McElhinney e Eleanor Tomlinson, entre outros.

 

Texto originalmente publicado aqui

 

Sara Quelhas

Recent Posts

O Vencedor: a história de um derrotado

As séries eslovacas e checas têm conquistado, aos poucos, o seu espaço no mercado português.…

8 meses ago

One Piece: adaptação reinventa Luffy

A Netflix estreou «One Piece», uma série baseada no sucesso do anime com o mesmo…

8 meses ago

Ahsoka: nova protagonista no universo Star Wars

Depois de uma passagem fugaz por «The Mandalorian» e «The Book of Boba Fett», Ahsoka…

8 meses ago

Only Murders in the Building T3: Streep à ponta de lança

Fica disponível na terça-feira, 8, o primeiro episódio da terceira temporada de «Only Murders in…

9 meses ago

As Flores Perdidas de Alice Hart: o trauma na (nossa) natureza

O Amazon Prime Video lança amanhã, 4 de agosto, a série «As Flores Perdidas de…

9 meses ago

The Full Monty: à deriva, outra vez

O Disney+ estreia esta quarta-feira, 14, a continuação da história trazida ao grande ecrã em…

11 meses ago