The White Lotus: uma fábula de tipos brancos e ricos

Um resort paradisíaco no Hawai parece lançar o mood certo para o verão, mas «The White Lotus» revela-se bem menos solarenga do que o esperado. A partir de dia 12, segunda-feira, na HBO Portugal.

Mike White regressa à criação de séries com estrondo, por detrás da ideia e da lente de «The White Lotus», uma série que mistura comédia e drama com um ambiente de sonho. O autor, mais conhecido por «Escola de Rock» (2003) e por apostas independentes como «Beatriz at Dinner» (2017), combina várias influências e um elenco notável para criar um mistério que promete agarrar a audiência nas próximas semanas.

Vamos por partes. «The White Lotus» recebe o mesmo nome do resort de luxo onde decorre a ação (além de uma ligação ao apelido do seu criador, White), e reúne um staff peculiar com um conjunto de clientes brancos e ricos particularmente exigentes. A série é, na sua essência, é uma sátira social e dos (falsos) bons costumes, que resulta na ilustração de uma sociedade decadente na sua pior luz. E com um catalisador que é apresentado logo no arranque da narrativa: alguém acabou mesmo por sair do destino paradisíaco… sem vida. Quem será a vítima? Será que o argumento está a ser óbvio ou não passará tudo de uma artimanha do discurso? Há seis episódios para descobrir.

O cast é um dos pontos fortes da trama. Dos talentos firmados aos emergentes, «The White Lotus» apresenta um conjunto de intérpretes com provas dadas e capazes de elevar o argumento, já de si bastante sólido, de White. Contam-se, além de outros, Murray Bartlett, Connie Britton, Jennifer Coolidge, Alexandra Daddario e Steve Zahn, além de jovens com carreiras estabelecidas como Sydney Sweeney (Euphoria, The Handmaid’s Tale, Sharp Objects), Fred Hechinger (A Mulher à Janela) e Brittany O’Grady (Star, Little Voice).

Por sua vez, as personagens são muito complexas e cativantes em termos narrativos. Armond (Bartlett) é o gerente do espaço, um homem cuja boa disposição parece encontrar entraves a cada novo hóspede; Belinda (Natasha Rothwell) é a responsável de bem-estar que vê surgir inesperadamente um sonho; Tanya McQuoid (Jennifer Coolidge) segue uma viagem solitária com a missão de libertar as cinzas da mãe; a família Mossbacher nem perde tempo a simular uma falsa perfeição; e os recém-casados Shane (Jake Lacy) e Rachel (Alexandra Daddario) depressa veem ameaçado o seu estado de graça.

Se o descontentamento mimado de Shane parece criar logo um conflito com Armond, o caso fica ainda mais bicudo com os comportamentos de risco de Olivia Mossbacher (Sydney Sweeney) e da sua amiga Paula (Brittany O’Grady). Todos os clientes vivem no limite do seu pedantismo, com atitudes que tornam difícil uma empatia com o espectador: a maioria são personagens hipócritas, petulantes e antissociais que contribuem para um ambiente cada vez mais tenso na ação. Da interpretação aos diálogos, bem como a banda sonora muitas vezes inquietante, todos os elementos contribuem para o status quo da nova série da HBO, que se torna também progressivamente mais interessante.

Uma das melhores séries do streaming até ao momento em 2021, «The White Lotus» aposta numa temporada sólida de seis episódios, sem prolongar em demasia nem apressar os acontecimentos. Tudo acontece a seu tempo, contribuindo para um melhor conhecimento dos clientes e staff presentes no resort de luxo, numas férias que se podem revelar para esquecer. E, aos poucos, a estadia aparentemente de sonho transita entre a caricatura dos ricos, a crítica social e um mistério ironicamente apetecível. Além disso, se teve de adiar as suas férias ou este ano a viagem vai ser mais curta, aproveite esta série para saborear um dos destinos mais desejados por esta altura (talvez não no The White Lotus…).

 

Texto originalmente publicado aqui

 

 

Sara Quelhas

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