A Netflix tem uma nova aposta repleta de estrelas: «The Four Seasons». Quando uma decisão inesperada abala a dinâmica de um grupo de amigos, as habituais férias sazonais em casal deixam de ser o refúgio tranquilo de sempre, e transformam-se num palco de tensões, revelações e novos começos.
Há algo de profundamente humano em testemunhar amizades que resistem (ou se desfazem) com o passar do tempo. «The Four Seasons», da Netflix, explora essa ideia com sensibilidade, humor e uma certa melancolia, retratando a passagem das estações não apenas no calendário, mas também na vida emocional das personagens. Tendo como ponto de partida e inspiração o filme homónimo de 1981, a série reinventa o conceito sem se prender a nostalgias fáceis, ao mesmo tempo que oferece uma narrativa contemporânea que toca em feridas muito humanas: o envelhecimento, as separações e o desconforto de ver os outros mudar quando estamos parados no tempo.
O elenco reúne nomes sólidos da comédia e do drama, capazes de dar vida a personagens que são, ao mesmo tempo, caricaturas e reflexos de relações reais. Kate (Tina Fey) é uma mulher perspicaz e pragmática que tenta manter a estabilidade do grupo mesmo quando tudo à sua volta começa a ruir; Jack (Will Forte) é o seu marido afável e algo passivo, enquanto Nick (Steve Carell) é o amigo que desencadeia a tempestade, nomeadamente ao surgir com a nova namorada Ginny (Erika Henningsen) durante uma das “escapadinhas” sazonais. A juventude de Ginny funciona como um catalisador para as inseguranças acumuladas dos restantes, numa presença que não é apenas externa, mas profundamente simbólica.
A este núcleo juntam-se Anne (Kerri Kenney), a ex-mulher de Nick, cuja amargura entra em conflito com uma tentativa genuína de manter a dignidade, e o casal formado por Danny (Colman Domingo) e Claude (Marco Calvani), que traz uma estabilidade emocional aparente, mas atravessa uma fase muito delicada. Todas as personagens estão encaixadas num jogo de forças instável, que a narrativa vai desequilibrando progressivamente.
«The Four Seasons» procura estabelecer uma mistura delicada entre comédia e drama, onde o riso surge como um alívio temporário para temas que, muitas vezes, são bastante dolorosos. A série alterna entre momentos de descontração e cenas de introspeção profunda, sem que um anule o outro. A leveza do humor, muitas vezes sarcástico, contrasta com os dilemas existenciais e as dificuldades emocionais que surgem ao longo da temporada, como a crise de meia-idade, o desgaste das relações e o desconforto (e medo) do envelhecimento.
Não obstante, esse equilíbrio nem sempre é atingido com sucesso; por vezes, a tentativa de suavizar cenas mais intensas pode parecer forçada, o que impede a série de explorar completamente as complexidades emocionais que estas situações exigem.
Por seu lado, a verdadeira força de «The Four Seasons» está nas suas relações interpessoais, que são complexas e multifacetadas. Ao explorar a amizade entre os protagonistas, a série consegue retratar de forma convincente as várias fases de uma relação de longa data: o desgaste, as expectativas não correspondidas, os segredos e a cumplicidade que persiste apesar das adversidades.
A trama não tem medo de expor a vulnerabilidade de cada uma das personagens, que enfrentam os seus próprios conflitos internos enquanto tentam manter a fachada de uma amizade intacta. Além disso, também explora temas como o medo do envelhecimento e as pressões associadas às expectativas sociais sobre a vida familiar e profissional, com foco particular na classe média.
Em «The Four Seasons» a escolha das estações do ano como metáforas para as fases da vida é uma das decisões mais profundas e, ao mesmo tempo, subtis da série. A narrativa faz uso das mudanças de estação para refletir a evolução emocional dos personagens, marcando o seu crescimento, estagnação e até declínio ao longo da história. Como as estações do ano, as personagens também atravessam períodos de transformação, reinvenção e confrontos com a inevitabilidade da mudança. Bem como períodos mais luminosos e outros mais turbulentos.
Ao longo dos episódios, a série equilibra as complexidades do tempo e da mudança com uma honestidade emocional que ressoa na experiência da audiência. «The Four Seasons» aborda o envelhecimento, o medo do futuro e as complicações das relações com uma mistura de leveza e profundidade, sem nunca perder o foco nas personagens e nas suas lutas internas. Apesar de alguns momentos mais forçados e de um ritmo por vezes desigual, a série consegue transmitir um retrato realista das tensões emocionais que surgem quando o passado e o futuro se encontram.
E, se há algo que «The Four Seasons» nos ensina, é que as estações da vida podem ser difíceis de navegar, mas a viagem vale a pena quando somos acompanhados por amizades genuínas, mesmo (ou sobretudo) nas fases mais complicadas.
Texto originalmente publicado na Metropolis
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