Dear Edward: uma terapia de grupo sobre a perda

A Apple TV+ estreou recentemente a série «Dear Edward», que retrata os acontecimentos após a queda de um avião, que teve apenas um sobrevivente, Edward. Uma história sobre luto, revolta, e como as peças não encaixam depois de uma grande tragédia.

Um conjunto de passageiros prepara-se para uma viagem importante, seja por se tratar de uma mudança completa de vida, seja por deixar relações familiares e amorosas em suspenso. A ansiedade vai subindo de tom, à medida de todos se preparam para a tragédia anunciada na sinopse da série: um desastre de avião. Na sequência do triste desfecho de dezenas de passageiros, apenas um consegue escapar: o pequeno Edward (Colin O’Brien), que viajava com os pais (Robin Tunney e Brian d’Arcy James) e o irmão (Maxwell Jenkins, de Perdidos no Espaço).

No entanto, e apesar do protagonismo assinalado no título da série, a verdade é que Edward é o condutor que permite a construção de uma storyline que toca muito mais intervenientes. Taylor Schilling, a Piper de «Orange is the New Black», tenta novamente o regresso a uma série consistente, depois de algumas minisséries e temporadas únicas (The Bite volta em 2024). Taylor é Lacey, a tia de Edward, que tenta engravidar, sem sucesso, há vários anos, e cuja relação com a irmã não era, de momento, a melhor. Instigada a adotar, a mulher recusa, mas acaba por, inesperadamente, “adotar” o sobrinho órfão. Isso leva-a a reavaliar não só a sua vida, como a sua preparação para assumir a responsabilidade criar uma criança.

Quem também tenta um regresso ao pequeno ecrã é Connie Britton, que não tem encontrado a estabilidade que viveu em «Nashville» desde o final da série. A atriz é Dee Dee, uma personagem que lembra recorrentemente Renata Klein (Laura Dern), de «Big Little Lies». A mulher pensa viver a vida perfeita, até à morte do marido, descobrindo uma nova realidade de dívidas financeiras, mentiras e vidas paralelas. O acontecimento leva-a ainda a repensar a relação com a própria filha, Zoe (Audrey Corsa), e a ter uma evolução.

Entre as restantes tramas, encontramos a história da neta de uma congressista histórica, o irmão de uma atriz ganesa e uma jovem grávida, entre outros. As diferentes narrativas cruzam-se no grupo de apoio que é criado para ajudar as famílias das vítimas a lidar com o trágico acidente. Embora o apoio profissional não pareça o mais competente, pelo menos na superfície, a verdade é que as personagens se aproximam naturalmente e entrecruzam os seus anseios e necessidades. Uma série que é uma terapia sobre a perda, e sobre as formas que esta assume, no silêncio e na revolta.

Com um argumento sólido e sem euforias, «Dear Edward» é uma série plana que esconde várias camadas, relacionadas com as emoções e os “fantasmas” que as personagens, individualmente, transportam consigo. Sem twists nem volte-faces surpreendentes, como outras séries dentro desta temática nos habituaram, a história está muito ligada ao lado humano após uma tragédia, e não a um mistério particular (evidente).

«Dear Edward» é uma adaptação de um livro com o mesmo nome, da autoria de Ann Napolitano. Os primeiros três episódios já estão disponíveis na Apple TV+.

 

Texto originalmente publicado aqui

 

Sara Quelhas

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