Love Life: a aritmética do amor

A HBO Portugal disponibilizou ontem os primeiros três episódios de «Love Life», uma comédia romântica protagonizada por Anna Kendrick, que transita este ano do cinema para a TV. Originalmente publicado na Metropolis.

Para quem tem saudades de «Foi Assim que Aconteceu» [How I Met Your Mother], nada temam: aqui está uma série focada no derradeiro amor, que se dedica, contudo, a contar a história dos relacionamentos da personagem principal com os ex. Com intervenientes secundários mais esquecíveis, é certo – ainda que tente inverter esta tendência, a espaços, com Bradley (Scoot McNairy).

À boleia de uma voz off, que lembra filmes como «(500) Dias com Ela» (2009) ou séries como «Pushing Daisies», vai-se desenhando o propósito da narrativa. Assente numa espécie de “matemática das relações”, «Love Life» coloca Darby (Anna Kendrick) no ponto zero e, ainda que o final seja antecipado, a viagem é desconhecida. Anunciada como uma antologia, centra-se, a cada temporada, na história de um/a protagonista do primeiro ao último amor; mostrando um sem fim de agruras, lugares-comuns e desilusões que vão surgindo ao longo do caminho.

A premissa da mais recente aposta da HBO é simples e, desde logo, tem a capacidade de agarrar o seu público-alvo ou perder aqueles que ali chegaram ao engano. Pode quase falar-se de seleção natural da série criada por Sam Boyd – que apresenta até agora um currículo tímido –, e cuja estrutura narrativa segue a linha de «Modern Love», mas de forma mais demorada.

Darby (Kendrick) é uma mulher com uma vida comum, ingénua e focada em encontrar o seu final feliz. Toda a ação se desenvolve à sua volta, entre colegas de casa, encontros inesperados e uma ilusão constante de que encontrou o amor da sua vida. Sem grandes artifícios ou storylines surpreendentes, «Love Life» procura, em vez disso, ir à vertente estereotipada dos relacionamentos: o esperar de uma chamada ou tomar a iniciativa, o romance com alguém recém-saído de um divórcio… É uma constante desconstrução da “matemática” que lhe serve de base, ao jeito de uma “rom-com” moderna e descomplexada.

Os diálogos têm propósitos sobretudo humorísticos, ainda que as pequenas “tragédias” que vão acontecendo a Darby motivem conversas mais sérias. O ritmo leve e descontraído de «Love Life» torna-a uma série fácil de ver, ainda que não desenvolva sobremaneira as personagens secundárias – mantendo-as a uma espécie de distância de segurança; e recorrendo maioritariamente às mesmas quando precisa de algo para alimentar a continuação do conflito interno de Darby. Contudo, a operação à base de “uma-história-por-episódio” acaba por fortalecer a abordagem mais superficial da trama.

Publicitada como a série de lançamento do novo serviço HBO Max nos Estados Unidos, a série despertou grandes expetativas que, ao não serem correspondidas, fizeram chover um chorrilho de críticas. Mesmo não se tratando de uma estreia incrível, «Love Life» acaba por dar resposta a um público ainda vasto – os fãs de comédias românticas –, ainda que “peque” pela incapacidade de procurar uma audiência mais generalizada. Trata-se da segunda série de Anna Kendrick, que recentemente protagonizou a curta «Dummy», da plataforma Quibi.

Sara Quelhas

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