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Game of Thrones e a Catarina, por Filomena

Passo os meus dias a falar de injustiça, expondo, conforme posso, casos do género, no meu trabalho. Aqui, a coisa não foi muito diferente. Embora, eu não seja ninguém para chegar a este mundo e começar a mandar bitaites, achei que devia falar de uma coisa que me incomoda. A Catarina não vê «Game of Thrones» e eu acho que isso devia mudar.

Encontrei uma pessoa que não vê GOT.

A Catarina é rebelde. E teimosa. Sempre foi. Crescemos juntas. Pensamos muitas vezes juntas e estivemos grande parte das vezes de acordo. Mas há dias descobri uma coisa. A Catarina, que “não é muito de ir ao cinema” mas que de vez em quando se apaixona por uma série, não viu, nem quer ver, Game of Thrones.

Quando o disse, para uma plateia pequena, quase familiar, demorei a encaixar aquela decisão. “Não vês? Nem queres ver?”, retorqui, mais para mim, do que para ela. “Como assim?”, questionei mais alto. “É só a melhor série de sempre”, justifiquei, sabendo bem a reação que viria a seguir. “Não, não quero ver. Anda tudo a falar do mesmo. É no Facebook, é o Instagram, já não há pachorra. Não acho piada aquilo sem ver, por isso não vale a pena tentares convencer-me. Muitos já tentaram“, atirou-me. Mirei-a, com vontade de lhe dizer: “Isso vai mudar, minha menina!”. Mas depois…é só uma série… Só que quem a viu sabe, não é uma série qualquer.

Eu, que nem televisão vejo, perdi, como tantos outros, noites de sono a tentar persuadir-me que era só mais um episódio e iria dormir. Nunca foi. Não seria agora, mesmo quando ando mais cansada. Não haveria de ser num futuro, se, como à época, só tivesse descoberto a maravilha de GOT quando a coisa ia prestes a entrar na numa temporada já muito avançada. Posto isto, e enquanto espero e desespero pelo desenrolar dos próximos capítulos, estou a tentar perceber como convenço a Catarina a desejar pelos sete reinos que o Inverno chegue rápido. Não vou lá só por lhe mostrar a carinha laroca do Jon Snow. (Essa era uma boa estratégia noutros tempos, não agora que estamos quase nos 30). Nem a convenço se lhe falar das mafiosices do Littlefinger ou dos sussurros dos passarinhos de Varys.

O enredo não parece interessar-lhe. Porque não se deu sequer ao trabalho de ver uma, uma só, imagenzinha da série. A Catarina podia muito bem ser comparada àquelas pessoas que dentro de casa não têm uma única peça comprada no IKEA. (Se é que essas pessoas existem!). Nesta minha luta cujo objetivo é levá-la à exaustão, até já lhe contei como me meteram na teia. Disseram-me: “Vês o primeiro episódio e nunca mais te sai da cabeça”. Na altura, foi o suficiente. Ao querer provar que era bem capaz de resistir, fiquei enfeitiçada.

E, depois de levar os meus irmãos a ficarem viciados também, queria poder bater no peito com orgulho: “Também tu Catarina, és uma das nossas!”. Só que não vejo maneira. E já debatemos o assunto algumas vezes. Termina sempre com ela a fazer-me aquela cara de “não me chateies”. Juro que me dá nervos. E depois volto a pensar, ok é só uma série… E neste jogo vou trocando de profissão e sendo o advogado do diabo: “É, não vejas, ainda te vicias”, só que nada. Já pensei em trancá-la lá em casa e obrigá-la a assistir ao primeiro… Confesso que a ideia ainda me paira na cabeça. Eu até assistia com ela.

É que «Game of Thrones» tem esta magia, de nos fazer acreditar que há sempre algo que não analisamos com a devida atenção. Há sempre pormenores que nos escaparam completamente. Há sempre forma de passarmos a amar ou a odiar (ainda mais) um vilão. Será mesmo o vilão um vilão? Vemos GOT e sabemos que a nossa cabeça fica pousada sobre placas tectónicas. E a qualquer momento muda tudo. Mas enquanto não sai a nova temporada, o que eu queria mesmo, era que a Catarina mudasse de opinião. Ela, que tem boa memória, ia ajudar-me a lembrar os nomes de todos os que já foram esfolados, degolados, decepados e queimados.

Como é que convencer uma pessoa a ver uma série tão boa pode parecer mais difícil do que vencer um exército de mortos? E entretanto…o Inverno está quase a chegar. E tu ias gostar de saber do que falo Catarina. Isso um dia vai ter mesmo que mudar, minha menina. Ai vai, vai.

Filomena Abreu

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