REVIEWS

Metalhead: Especial Black Mirror S4 (3 de 6)

“Metalhead” é dedicado a todos aqueles entre nós que, bem lá no fundo, mas mesmo no fundo, desejam que chegue o fim do mundo. Os que anseiam pelo dia em que iremos andar com mochilas às costas, de canivete na mão, com as últimas roupas compradas na secção de campismo de uma grande superfície qualquer. Para todos os que olham para o carro enquanto vão para o trabalho de manhã e se perguntam “Como é que isto se comportava se estivesse a ser perseguido por [inserir praga/animal/criatura sobrenatural favorita]?”.

Mesmo sabendo que iremos morrer nos primeiros dias — ainda o stock do Pingo Doce não esgotou e já comemos uma baga venenosa qualquer no pinhal mais próximo —, queremos que esse dia chegue. Não queremos saber se é porque afinal o juízo final da Bíblia existe, se são aliens, se é um vírus, se é o aquecimento global, se as máquinas se revoltaram ou se os EUA finalmente estragaram tudo. E ainda bem que não queremos, porque Metalhead não nos dá nenhum motivo para o que iremos encontrar ao longo de 40 minutos.

40 minutos. Que bom. A preto e branco, que cá o fim do mundo não vai ser transmitido a cores. Rápido, sem grandes falas e conciso. Sem explicações. 40 minutos de sobrevivência pura. 40 minutos para alguém encontrar algo num armazém, que será precioso para outro alguém mas que é interrompido por um cão robot — a tecnologia de ponta, o único elemento neste mundo pós-apocalíptico que nos mostra que, apesar de ainda existirem árvores e a paisagem como a conhecemos, algo correu mal. O cão que consegue ligar-se a qualquer sistema electrónico, que detecta movimento humano e cujo único objectivo é localizar e exterminar os mesmos. Para quem? Não sabemos. Há imagens de drone e apenas isso.

Não precisei de ver todos os outros desta temporada de Black Mirror para perceber que este não será o melhor ou dos melhores. Dos preferidos, vá. Nada de novo aqui. Mas gosto da maneira despretensiosa como é filmado, da performance da actriz (Maxine Peake), de como tudo está conjugado. Seria de esperar que a ausência de cor e falas tornasse tudo chato mas os silêncios são facilmente preenchidos por tudo o resto que está no ecrã.

É um pós-Apocalipse viável. Não há cá roupas da colecção Fim do Mundo da Zara, os carros não estão equipados para a guerra – não há nada de glamouroso numa Skoda Octavia -, não existem heróis, apenas existe o ser humano. Metalhead vai além da questão da sobrevivência, aqui já está mais do que instalada como um traço humano e não como algo que se aprende. Metalhead é sobre o que somos capazes de fazer para manter uma réstia de humanidade.

 

Filipa Mota

Recent Posts

O Vencedor: a história de um derrotado

As séries eslovacas e checas têm conquistado, aos poucos, o seu espaço no mercado português.…

8 meses ago

One Piece: adaptação reinventa Luffy

A Netflix estreou «One Piece», uma série baseada no sucesso do anime com o mesmo…

8 meses ago

Ahsoka: nova protagonista no universo Star Wars

Depois de uma passagem fugaz por «The Mandalorian» e «The Book of Boba Fett», Ahsoka…

8 meses ago

Only Murders in the Building T3: Streep à ponta de lança

Fica disponível na terça-feira, 8, o primeiro episódio da terceira temporada de «Only Murders in…

9 meses ago

As Flores Perdidas de Alice Hart: o trauma na (nossa) natureza

O Amazon Prime Video lança amanhã, 4 de agosto, a série «As Flores Perdidas de…

9 meses ago

The Full Monty: à deriva, outra vez

O Disney+ estreia esta quarta-feira, 14, a continuação da história trazida ao grande ecrã em…

11 meses ago